livre
associo
Misturo de um tudo. Nas ruas, louras, louras,
louras. Chego mais perto, são negras as raízes dos cabelos. As louras, na
verdade, são morenas. Barbie, modelo de beleza, american way of life, é
referência. Nas falsas-louras nativas, talvez angústia por não serem,
originalmente, semelhantes aos ídolos adotados.
Comunicação é meio,
mesmo o meio sendo em si mensagem. O primeiro
desafio que vivo é perceber o que meu próprio inconsciente tenta me comunicar. Apesar
dos impedimentos por parte de outras partes de mim. Fico atento aos sinais que me
dão meus atos falhos. Ato falho não falha!
Conteúdos que me tocam me emocionam. Minha memória
afetiva, sinto, permanece. Minha memória racional me escapa. De que mesmo eu estava
falando?
Quero aprender, como diz Simone de Beauvoir,
“viver sem tempos mortos”. Concordo com Sérgio Mello: os planos funcionam, difícil
é o cronograma. Também com alguém, não me lembro quem: seja o que deseja
ser.
De vez em quando me pego muito eficiente, no caminho
errado. Perdi minha vida por educação. Foi Verlaine quem disse?
Esta aprendi com Adalberto de Paula Barreto –
a pergunta que antes, submisso, fazia a outros, agora tenho perguntado ao
espelho: que você quer que eu queira, pr’eu querer?
Aprendi e me tem feito bem: meu humor como indicador.
Se estou de bom humor, estou bem. Se de mau humor, estou mal. Identifico-me com
o que entendi do FIB, Felicidade Interna Bruta.
Meus filhos, meus amigos aprendem comigo mais
pelo que sou do que pelo que falo. Vice versa, eu também.
Meus desejos me mobilizam. Eu me movimento a
partir dos meus desejos. Desejos são básicos aos meus movimentos. Procuro
descobrir quais meus
desejos.
Tento construir, pelas ações, pontes entre
desejos e práticas. Pra facilitar, só quando preciso, numa coluna listo as
tarefas que julgo necessárias para a realização do desejo. Ao lado de cada
tarefa, em outras 4 colunas, prevejo datas, custos, responsáveis e anoto outras
observações. Dentro de mim, o conflito entre prever-planejar e não ter agenda, não
limitar o futuro. Talvez eu possa planejar e adaptar à realidade o que antes
previ.
Se não gozo quando transo, permaneço com uma
vivacidade juvenil, o prazer permanece. O gozo já não é meta. A meta, se
existe, é o prazer em cada momento.
Onde vai meu pensamento, vai minha energia.
Aprendo escolher pensamentos.
De Freud entendi que muitos dos conteúdos dos
sonhos estão relacionados a acontecimentos do dia anterior. Quando suporto
alegria, antes de dormir, leio o que me faz sentir bem. Quando acordado, evito
situações que me gerem sentimentos desagradáveis.
Outros em outras épocas já descobriram um
tanto disto tudo. Esta memória coletiva onde está? Sei que quando relaxo,
capto.
Volta e meia me pego,
inconsciente, estragando prazeres: ao brigar
com a namorada quando estava gostoso, ao chutar pedra quando a caminhada tava boa, ao detonar um trabalho que me
trazia enlevo... Muitas vezes senti como insuportável a alegria. A minha, as de
outros. Percebi o mesmo em outros.
Permaneço desconfiado que isto se relaciona
com minha cultura cristã, que proíbe emoções, prazeres – vide os 10 mandamentos
e os 7 pecados capitais. Serei castigado – agora ou depois da morte – se
transgrido alguma regra.
Perdi minha inocência quando fui catequizado.
Antes, em mim só existia um senso ético. Não existiam pecados mortais, veniais,
infernos. A moral veio como doutrina. Internalizei as regras e as consequências
de transgressões: dentro de mim, associo o prazer ao castigo. Logo que percebo
prazer, lembro castigo.
Evito castigos eliminando prazeres.
Os prazeres se tornam então insuportáveis.
Agora, consciente, aprendo ser mais
responsável por mim mesmo, minhas ações, minha vida. Sei que já não devo
reclamar da pedra ao tropeçar nela. Eu é que não prestei atenção. Reclamo antes
ao espelho.
Algumas vezes minha vida ficou sem sentido. Tanto
fazia viver, morrer. Não cheguei a procurar a morte. Mas a vida tava sem gosto. A lembrança dos filhos
me animava. Eu era resiliente e não sabia: vim do quase fundo do poço ao
equilíbrio dinâmico de agora.
Antes dos 8 anos já sabia da proibição dos
prazeres. Vivi prazer e medo em secretas descobertas infantis. E punhetas
silenciosas das 2 da tarde aumentavam culpas, pavores e rezas noturnas. Aos 14,
no beco dos meninos, tive a sorte do acolhimento tranquilo naquele corpo
diferente do meu. Aprendi a gostar de mulher.
Mas perdi mesmo a grande inocência quando
sofri o catecismo. Não sabia de pecados – mortais, veniais – e castigos. Ficou
um medo enorme do inferno eterno, chamas que nunca acabam. Foi como um insight
ao contrário, um indark.
Wilhelm Reich foi um choque bom. Perdi outra inocência,
ganhei consciência: sou responsável por mim.
Hoje leio sem ter que fazer provas. Só em boa
companhia, adoro orelhas de livros, vejo trechos de Freud, Jung, Nise, Bubber,
Moreno, Lobsang, Rajneesh, Lacan, Platão, Voltaire, Saint-Exupéry, Szasz,
Chang, Capra, Moody, Rogers, Beauvoir, Lobato, Quino, Monroe, Veríssimo, Barreto,
Cançado, Ferenczi, Angeli, Brunton, Eco, Laing, Freire, Ziraldo, Ludemir,
Nietzsche, Feitosa, Pessoa, Moraes, Pontes, Chacal, Robin... e por aí vou. Se
entendo, ai, que bom.
Se não, vou em frente, volto, folheio. Antes
de dormir, então, leituras facilitam o sono, os sonhos. É uma forma de oração,
cuidar do que me vai dentro.
As sínteses de Pontes, o Roberto: todo
mundo é, todo mundo pode ser. E: o saber em todo ser. Mais ainda: amor
e medo, emoções básicas.
Lembro a Chiquita Bacana de João de
Barro:
existencialista, com toda razão, só faz o que
manda o seu coração.
E talvez Sartre: não importa o que fizeram
com minha vida. Importa o que vou fazer com o que fizeram da minha vida.
E o título do livro póstumo de Winnicott:
Tudo Começa em Casa.
Luiz Fernando Sarmento
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