domingo, 26 de março de 2017

Uma vida incomum 04 - O trabalho como prisão




Livre pensar 04

O Trabalho como Prisão


Para tentar mudar a situação – ou para manter a situação que lhe agrada - o poder reage com o controle e o castigo. A imagem antiga é a do feitor com o chicote. A imagem atual é a do relógio de ponto, do corte do salário, da suspensão, do controle de papel. Tanto controle se torna necessário, que uma grande quantidade de mão-de-obra é destinada a esta tarefa. O volume do trabalho de controlar pede utilização de tecnologia avançada. Entram os computadores. São formados especialistas em controles. Faz-se a ciência do controle. Isto, já há tempos, são fatos no Brasil, em boa parte do mundo.

Como resolver então o problema do aumento de produção, dito tão necessário? Em última instância, um dos fatores decisivos para o aumento de produção é a mão-de-obra. Em mão-de-obra leia-se gente.

A mão-de-obra deverá ter a sua produtividade aumentada. Poderá também ter o volume de tempo de trabalho aumentado.

Sigamos pelo aumento de produtividade: isto com certeza aumentará a produção. Como fazer com que isto aconteça? Tentando fazer com que a mão-de-obra participe por iniciativa própria? Tentando controlar o seu trabalho? Enfim: mão-de-obra autônoma ou mão-de-obra mecânica?

Para a formação de autômatos, reforçar o controle e o castigo é um caminho. Para a formação de autônomos, temos que refletir.


Anotações sobre a Autonomia

Nos anos 70 tentei me aproximar de assuntos ligados à relação corpo-mente, no ser humano. Acredito, como outros observadores, que, via de regra, o corpo é um espelho da história de cada um. A barriga, o olhar, o andar, o falar, são sinais da história de cada um. A nuca que dói pode ser sintoma do músculo que endureceu de tanta tensão provocada, por exemplo, pelo medo. A boca rigidamente fechada pode refletir a raiva tão longamente contida.

Acredito também, pela observação e alteração de mim mesmo, que a situação pode ser mudada. Um lado gratificante é a ampliação da percepção, o acesso a novos olhares. Uma boa e honesta conversa, também consigo mesmo. Parece, porém, ser indispensável tentar entender profundamente o ser humano, para apoiá-lo no seu novo parto. Para ajudá-lo a aprender a andar, pensar, agir, ser autônomo.

Antes, ou paralelamente, cada um por si tentar perceber o próprio corpo, suas emoções, sua própria mente, acredito ser mais do que necessário a todo aquele que tenta perceber os outros, orientar a outros, dirigir. Desenferrujar-se, aprender a lubrificar-se, tornar-se autônomo: um sonho possível de realizar-se.


Luiz Fernando Sarmento






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